Crônica do Dia

kátia-muniz2Para você que eu tanto amo.

Por: Kátia Muniz                                                                            katiacronicas@gmail.com

Na infância, nunca levei muito jeito com bonecas, não tinha paciência para ficar dando comidinhas feitas com areia, nem para empurrar os carrinhos de plástico, usados para levar a boneca para passear.

Em compensação, gastava horas batendo numa folha de papel para que produzisse um som que lembrasse o de uma máquina de escrever, enquanto atendia, efusivamente, às chamadas imaginárias do meu telefone de brinquedo.

Eu era secretária executiva de uma grande empresa, tinha carro próprio e morava, sozinha, em um apartamento. Tudo isso aos 8 anos de idade. Minhas amigas, da mesma idade, estavam todas casadas com seus maridos de mentirinha e com duas ou três bonecas como filhas.

Muitos anos se passaram e, quando boa parte dessas amigas de infância tornaram-se avós, eu me tornei mãe.

Naquela sexta-feira, do mês de março, eu nasci para a maternidade dando à luz a você, meu filho.

Quando a enfermeira trouxe você, de banho tomado, com o cabelinho todo lambido para um lado, eu estiquei os meus braços e segurei você com aquele jeito que só as mães sabem.

E o botão da natureza humana foi ligado. De repente, eu sabia segurar, trocar fralda, amamentar. Não fez a menor falta a ausência do estágio com as bonecas.

Esses dias entrei no seu quarto, cuidadosamente, afastei os cabelos que caíam sobre a sua testa e depositei um beijinho carinhoso. Aquele beijinho que só as mães sabem dar.

Você abriu os olhos, resmungou um pouco e se levantou.

Eu fiquei olhando você se movimentar. Primeiro, até banheiro e, depois colocar o uniforme escolar e me perguntar o que eu serviria no café.

Café? Sim. Café. Não há mais as mamadeiras e, no lugar do berço, há uma cama, na qual daqui a um tempo, você, provavelmente, mal caberá. Aconteceu o que eu temia: você está crescendo.

Despediu-se de mim com um beijo. Aquele beijo que só os filhos sabem dar.

Fiquei sozinha, na inquietude dos meus pensamentos e remoendo todas as inseguranças de mãe, as mesmas que nos acompanham sempre, somente mudando as formas e as fases.

O cenário já se modificou. Não passo mais meus dias catando aviões, carrinhos da Hot Wheels, soldadinhos, que viviam espalhados pela casa. Minha sala retoma o seu posto, as almofadas permanecem no lugar, perdeu os ares de jardim de infância.

Nossos olhos, mais um pouco, já se nivelarão na mesma altura. E, mais para frente, será sua vez de abaixar seus olhos para que eles encontrem os meus.

Você vai adotando suas preferências, vai impondo seus gostos, vai ganhando autonomia. Tudo certo. Tudo normal. Estranharia se não fosse assim.

É preciso que você saiba: nunca perca a direção dos meus braços, eles sempre vão envolver você, como se fosse a primeira vez, daquele jeito que só as mães sabem.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *